Bullying não é brincadeira: desde 2024, é crime passível de multa
07/04/2025
(Foto: Reprodução) Dia Nacional de Combate ao Bullying e à Violência na Escola é lembrado nesta segunda-feira (7). No DF, denúncias aumentaram em 243% de 2023 para 2024, segundo Polícia Civil. Bullying é prática de agredir física ou psicologicamente uma pessoa
Jader Souza/ SupCom ALE-RR
Em 2024, 120 denúncias de bullying foram feitas à Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF): um aumento de 243% em relação ao ano de 2023. No Dia Nacional de Combate ao Bullying e à Violência na Escola, lembrado nesta segunda-feira (7), é preciso alertar que o bullying nunca foi uma brincadeira e que, desde 2024, é crime tipificado no Código Penal.
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🔎 Bullying: intimidar sistematicamente, individualmente ou em grupo, mediante violência física ou psicológica, uma ou mais pessoas, de modo intencional e repetitivo. A intimidação se dá por atos de humilhação, de discriminaçã,o ou de ações verbais, morais, sexuais, sociais, psicológicas, físicas, materiais ou virtuais.
📌 A pena para quem faz bullying é uma multa que pode variar o valor dependendo da gravidade da conduta.
"Se condenado na pena de multa, o juiz determina quantos dias de multa o réu deverá pagar, de acordo com a gravidade do crime (por exemplo, 10, 30, 100 dias). Depois, define o valor de cada dia-multa, que pode variar entre 1/30 e 5 vezes o salário mínimo vigente, conforme a condição econômica do condenado", diz o advogado criminalista Guilherme Augusto Mota.
A judicialização é a melhor resposta?
O advogado criminalista Guilherme Augusto Mota afirma que a inserção do bullying no Código Penal é uma forma do Estado reconhecer juridicamente um fenômeno que foi negligenciado ou banalizado como "brincadeira de criança. No entanto, o especialista ressalta que "a resposta normativa é necessária, mas não suficiente: o fenômeno tem raízes sociais, psíquicas e culturais que não se resolvem unicamente pela via penal".
Ou seja, o problema do bullying, segundo o advogado, não se resolve somente punindo os agressores, pois é preciso uma reformulação de estruturas que toleram, silenciam ou reproduzem a violência. A questão não se resume apenas a "vítimas inocentes" e "agressores perversos" já que todos os envolvidos, como os que assistem, silenciam ou se omitem, têm um papel na perpetuação ou superação do ciclo, segundo Guilherme Augusto Mota.
Para o advogado, a judicialização excessiva pode gerar efeitos graves na formação de adolescentes, ou seja, a resposta ao bullying deve ser também pedagógica e não apenas sancionatória.
"O bullying é, muitas vezes, a face visível de uma teia de negligência, de ausência de políticas públicas e de déficit na formação emocional. O papel do Estado é também — e sobretudo — o de fomentar um ambiente pedagógico seguro, inclusivo e pautado em valores democráticos. A responsabilização é legítima, mas deve vir acompanhada de estratégias preventivas e restaurativas", afirma o advogado.
Dia Nacional de Combate ao Bullying e à Violência na Escola
O Dia Nacional de Combate ao Bullying e à Violência na Escola foi criado em 2016, por meio da lei n° 13.277/2016. Ao g1, o Ministério da Educação destaca que a lei é resultado do Projeto de Lei n° 3015/2011 do deputado Artur Bruno (PT-CE).
🔎 O dia 7 de abril foi escolhido por conta do ataque na Escola Municipal Tasso da Silveira, no bairro de Realengo, na Zona Oeste do Rio, que ocorreu em 7 de abril de 2011. O ex-aluno, Wellington Menezes de Oliveira, de 23 anos, entrou na escola com duas armas e fez 62 disparos contra os estudantes: 12 crianças de 13 a 15 anos morreram.
"A data consolidou-se como um marco simbólico na agenda de proteção da infância e da juventude, reafirmando o compromisso do Estado e da sociedade com a construção de ambientes escolares seguros, acolhedores e promotores de direitos", diz o Ministério da Educação.
Consequências do bullying
A violência ocorrida no ambiente escolar pode deixar marcas na vítima. Segundo o Ministério da Educação, de acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) de 2019, 39,1% dos estudantes de 13 a 17 anos relatam ter se sentido humilhados por provocações de colegas nos 30 dias anteriores à pesquisa. As principais motivações mencionadas incluem:
Aparência do corpo (16,5%)
Aparência do rosto (10,9%)
Raça/cor (4,6%)
Orientação sexual (2,5%)
O bullying esconde muitas violências como racismo, capacitismo, gordofobia. É preciso identificar qual é a violência que a vítima está sofrendo, porque essa abordagem vai ser diferente em cada uma. Não é possível tratar todas as violências da mesma forma."
Para a professora Catarina de Almeida Santos, para identificar a violência, é preciso olhar para cada estudante e suas características. Em crianças vítimas de bullying, os principais sinais aparecem em mudanças de comportamento e em reações físicas, como:
Fobia escolar
Apatia ou retração emocional
Falta ou excesso de apetite
Queda no rendimento escolar
Ataques de pânico ou de ansiedade
Asia, vômito ou mal-estar; entre outros
📌 A maioria das vítimas de bullying, em 2024, no DF foram meninas de 12 a 15 anos, segundo o levantamento da Polícia Civil do Distrito Federal (veja gráfico abaixo).
O perfil das vítimas de bullying por sexo e faixa etária em 2024 no DF.
PCDF/Divulgação
O que pode ser feito para combater o bullying nas escolas?
Para combater o bullying, a melhor estratégia é a prevenção, como destaca a professora da Faculdade de Educação da UnB, Catarina de Almeida Santos. Ao g1, especialistas entrevistados afirmam que alguns caminhos para ações de combate ao bullying são:
Mediação escolar
Formação continuada de professores
Canais seguros de escuta
Fortalecimento da cultura da empatia e da convivência plural
Equipes multidisciplinares nas escolas para ser uma rede de acolhimento
Desenvolvimento de conteúdos sobre combate ao bullying e respeito as diferenças
Ensino a partir do diálogo
Permitir que crianças e adolescentes enxerguem a si mesmos
"O melhor caminho é desenvolver uma educação em que as pessoas entendam que é preciso respeitar o outro. [...] Construindo um espaço de aceite e respeito na diversidade a gente se educa pela diferença", diz a professora Catarina de Almeida Santos.
📌 Dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) de 2021 apontam que 46% dos professores relataram ocorrência de bullying em suas escolas, enquanto 70,1% das escolas desenvolvem projetos temáticos sobre o tema.
Para funcionar, as iniciativas devem ter uma intervenção sistêmica com o envolvimento de toda a comunidade escolar: professores, direção, corpo técnico, pais, responsáveis e funcionários terceirizados.
"Ações isoladas — centradas unicamente nos alunos, em campanhas moralizantes ou em fórmulas genéricas — não são eficazes. [...] A prevenção exige corresponsabilidade institucional e sensibilidade para as realidades locais", destaca o advogado criminalista Guilherme Augusto Mota.
Ou seja, tanto a desresponsabilização dos pais e a omissão por parte das escolas precisam ser considerados para reverter o ciclo de bullying, como destaca o professor da Faculdade de Educação da UnB Francisco José Rengifo. "Boa parte da publicidade das escolas particulares está associada com suposto processo da aprovação, independentemente da formação moral, ética e social do indivíduo", diz o professor.
"Se quer combater o bullying tem que trabalhar numa dinâmica de autoconhecimento, de reflexão, de onde vem os valores que construí como indivíduo", aponta o professor Francisco José Rengifo.
A escola, muitas vezes, oscila entre a omissão e a repressão no combate ao bullying, no entanto, tanto vítimas como agressores precisam de acolhimento e orientação qualificada, segundo o advogado criminalista Guilherme Augusto Mota.
"O bullying é um fenômeno coletivo e sua superação também deve ser", diz Guilherme Augusto Mota.
Iniciativas em escolas do DF
Ocorrências envolvendo bullying em escolas aumentaram 240%
No Centro de Ensino Médio 1 do Guará, um projeto para combater o bullying e a violência na escola foi desenvolvido por professores com foco no protagonismo do estudante. Os alunos interessados em participar da iniciativa passam por uma formação de técnicas de acolhimento e escuta.
Depois, eles conversam com outros estudantes e colegas que possam estar sofrendo bullying e encaminham os possíveis casos para os especialistas da escola. Ou seja, os próprios alunos fazem o primeiro contato com possíveis vítimas de bullying para oferecer ajuda.
Veja abaixo o que os estudantes voluntários dizem sobre o projeto:
"Já sofri bullying e eu sei como uma pessoa se sente. Eu entendo que não é fácil, não é de qualquer maneira que você chega na pessoa, de como você deve acolher ela se caso você saiba que ela está passando por uma situação difícil", diz Miguel Lima.
"A gente analisa, normalmente, os alunos que são mais quietos ou isolados. A gente conversa 'oi, você tá bem?', 'Precisa de ajuda?', 'Quer companhia?' , e a gente tenta acolher de uma forma mais leve", diz Camila Paz.
"Não é só a gente [os estudantes], são os professores, a diretoria. Eles são o nosso suporte, principalmente", diz Ana Clara Albuquerque.
Estudantes do Colégio Sigma participam de rodas de conversa.
Sigma/Divulgação
Um outro projeto que foi implementado no Colégio Sigma é a Convivência Ética, com aulas semanais que incluem rodas de diálogo chamadas de Círculos de Confiança. Os estudantes se reúnem para conversar e refletir sobre situações que os incomodam.
De acordo com e escola privada, é o local onde os alunos aprendem a traduzir em palavras os sentimentos e preocupações (veja imagem acima).
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